O que é inclusão?
É a nossa capacidade de entender e reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e compartilhar com pessoas diferentes de nós. A educação inclusiva acolhe todas as pessoas, sem exceção. É para o estudante com deficiência física, para os que têm comprometimento mental, para os superdotados, para todas as minorias e para a criança que é discriminada por qualquer outro motivo. Costumo dizer que estar junto é se aglomerar no cinema, no ônibus e até na sala de aula com pessoas que não conhecemos. Já inclusão é estar com, é interagir com o outro.
Que benefícios a inclusão traz a alunos e professores?
A escola tem que ser o reflexo da vida do lado de fora. O grande ganho, para todos, é viver a experiência da diferença. Se os estudantes não passam por isso na infância, mais tarde terão muita dificuldade de vencer os preconceitos. A inclusão possibilita aos que são discriminados pela deficiência, pela classe social ou pela cor que, por direito,ocupem o seu espaço na sociedade. Se isso não ocorrer, essas pessoas serão sempre dependentes e terão uma vida cidadã pela metade. Você não pode ter um lugar no mundo sem considerar o do outro, valorizando o que ele é e o que ele pode ser. Além disso, para nós, professores, o maior ganho está em garantir a todos o
direito à educação.
O que faz uma escola ser inclusiva?
Em primeiro lugar, um bom projeto pedagógico, que começa pela reflexão. Diferentemente do que muitos possam pensar, inclusão é mais do que ter rampas e banheiros adaptados. A equipe da escola inclusiva deve discutir o motivo de tanta repetência e indisciplina, de os professores não darem conta do recado e de os pais não participarem. Um bom projeto valoriza a cultura, a história e as xperiências anteriores da turma. As práticas pedagógicas também precisam ser revistas. Como as atividades são selecionadas e planejadas para que todos aprendam? Atualmente, muitas escolas diversificam o programa, mas esperam que no fim das contas todos tenham os mesmos resultados. Os alunos precisam de liberdade para aprender do seu modo, de acordo com as suas condições. E isso vale para os estudantes com deficiência ou não.
A escola precisa se adaptar para a inclusão?
Além de fazer adaptações físicas, a escola precisa oferecer atendimento educacional especializado paralelamente às aulas regulares, de preferência no mesmo local. Assim, uma criança cega, por exemplo, assiste às aulas com os colegas que enxergam e, no contraturno, treina mobilidade, locomoção, uso da linguagem braile e de instrumentos como o soroban, para fazer contas. Tudo isso ajuda na sua integração dentro e fora da escola.
Como garantir atendimento especializado se a escola não oferece condições?
A escola pública que não recebe apoio pedagógico ou verba tem como opção fazer parcerias com entidades de educação especial, disponíveis na maioria das redes. Enquanto isso, a direção tem que continuar exigindo dos dirigentes o apoio previsto em lei. Na particular, o serviço especializado também pode vir por meio de parcerias e deve ser oferecido sem ônus para os pais.
Estudantes com deficiência mental severa podem estudar em uma classe regular?
Sem dúvida. A inclusão não admite qualquer tipo de discriminação, e os mais excluídos sempre são os que têm deficiências graves. No Canadá, vi um garoto que ia de maca para a escola e, apesar do raciocínio comprometido, era respeitado pelos colegas, integrado à turma e participativo. Há casos, no entanto, em que a criança não consegue interagir porque está em surto e precisa ser tratada. Para que o professor saiba o momento adequado de encaminhá-la a um tratamento, é importante manter vínculos com os atendimentos clínico e especializado.
A avaliação de alunos com deficiência mental deve ser diferenciada?
Não. Uma boa avaliação é aquela planejada para todos, em que o aluno aprende a analisar a sua produção de forma crítica e autônoma. Ele deve dizer o que aprendeu, o que acha interessante estudar e como o conhecimento adquirido modifica a sua vida. Avaliar estudantes emancipados é, por exemplo, pedir para que eles próprios inventem uma prova. Assim, mostram o quanto assimilaram um conteúdo. Aplicar testes com consulta também é muito mais produtivo do que cobrar decoreba. A função da avaliação não é medir se a criança chegou a um determinado ponto, mas se ela cresceu. Esse mérito vem do esforço pessoal para vencer as suas limitações, e não da comparação com os demais.
Um professor sem capacitação pode ensinar alunos com deficiência?
Sim. O papel do professor é ser regente de classe, e não especialista em deficiência. Essa esponsabilidade é da equipe de atendimento especializado. Não pode haver confusão. Uma criança surda, por exemplo, aprende com o especialista libras (língua brasileira de sinais) e leitura labial. Para ser alfabetizada em língua portuguesa para surdos, conhecida como L2, a criança é atendida por um professor de língua portuguesa capacitado para isso. A função do regente é trabalhar os conteúdos, mas as parcerias entre os profissionais são muito produtivas. Se na turma há uma criança
surda e o professor regente vai dar uma aula sobre o Egito, o especialista mostra à criança com antecedência fotos, gravuras e vídeos sobre o assunto. O professor de L2 dá o significado de novos vocábulos, como pirâmide e faraó. Na hora da aula, o material de apoio visual, textos e leitura labial facilitam a compreensão do conteúdo.
Como ensinar cegos e surdos sem dominar o braile e a língua de sinais?
É até positivo que o professor de uma criança surda não saiba libras, porque ela tem que entender a língua portuguesa escrita. Ter noções de libras facilita a comunicação,mas não é essencial para a aula. No caso de ter um cego na turma, o professor não precisa dominar o braile, porque quem escreve é o aluno. Ele pode até aprender, se achar que precisa para corrigir textos, mas há a opção de pedir ajuda ao especialista.
(Fonte- http://revistaescola.abril.com.br/inclusao/inclusao-no-brasil/maria-teresa-egler-mantoan-424431.shtml)